Uma história como aquela, de vidas passadas desejando se reencontrar em reencarnações desmemoriadas, poderia ser uma perfeita história de filme. Talvez pelo cachê certo, Helena até aceitasse participar, parecia ser interessante a ideia de encontrar alguém predestinado a estar ao seu lado, alguém que lhe permitisse descobrir o que verdadeiramente era o amor.. Mas, ali estava ela, envolvida até os ossos, sem ganhar um centavo por isso. A ideia de que poder, porém, aquele pedido de Zafira despertou a curiosidade e a ânsia de descobrir de vez o que era o amor lhe fazia disposta a ajudar, muito mais do que descobrir o seu ‘grande amor’. Matteo, por outro lado, não tinha qualquer interesse em chamar aquela história como sua. A atenção que recebia já lhe era inconveniente sem que os rumores inventados pela população de Khadel se intrometessem nos seus dias sobre a maldição dos apaixonados. Não queria ser uma daquelas pessoas, mas a curiosidade lhe era maior do que sua falta de intenção em ser um participante ativo daquela situação, então ele se viu no encontro com Zafira e o grupo mais heterogêneo que poderia imaginar.
Tudo parecia uma burocracia demais com aquele aplicativo — que com certeza estava com um bug gigantesco por colocar Helena com a pessoa mais calada do grupo, Matteo — mas na cabeça da atriz as coisas eram tão mais simples. Não precisava gostar um do outro para realizar uma missão, até porque quantas vezes filmou obras de arte com pessoas que desprezava? “Um punhal? Não podia ser algo mais normal?” Perguntou retoricamente a Matteo parando ao seu lado para terminar de ouvir as instruções. A negra cruzou os braços, ponderando como poderiam fazer aquilo acontecer, afinal o antiquário era na cidade vizinha… Ela deu um longo suspiro virando o calcanhar para ficar de frente ao gigante. “Consegue descobrir onde é? Eu dou um jeito no transporte… Não vai ser um helicóptero mas acho que daria conta. Bora rápido moço.” Helena teria que cobrar alguns favores? Talvez, mas logo pegou o telefone e começou a digitar a procura de alguém que pudesse lhe ajudar.
Matteo não podia deixar de se questionar o que se passava na cabeça de Helena. Será que ela se via realmente tão acima e distante dos outros ou será que ela estava brincando? Não conseguia realmente decidir, mas não iriam ganhar nada arrumando encrenca naquele momento. Ele puxou o seu celular e começou a digitar as únicas coisas que podia ‘punhal + antiquário’ e procurar em qualquer um que fosse ao redor de Khadel. Ele deveria ter desafiado Helena a achar aquilo, afinal com todas as conexões que ela tinha, aquilo poderia ser bem mais rápido, mas depois de um longo suspiro, ele se manteve atento a qualquer possível sinal na sua tela de que estavam indo na direção correta. Foi no site de um antiquário em Siena que ele achou a coisa mais similar possível. Zafira não os havia ajudado tanto assim. Quem diria que a conexão com os espíritos não lhe dava coordenadas para o GPS? “Helena, eu acho que é esse aqui,” ele disse, mostrando a foto de um punhal numa redoma de vidro no site do antiquário Galleria Novecento.
Não demorou vinte minutos após Helena concluir uma ligação que um rapaz dirigindo um conversível apareceu na frente da loja. Matteo franziu a testa observando o conversível se aproximar. ‘Não tinha nada mais chamativo?’ Era o que se passava pela cabeça dele. Com seu famoso sorriso, Helena dispensou o homem que havia trazido o conversível e entrou no motorista, abrindo a janela para encarar Matt sem o vidro negro atrapalhando sua visão “Bora? Não temos muito tempo, senhor gigante.” disse com um sorriso brincalhão. Matteo poderia ter devolvido as palavras que estava sendo tão delicadas dela, mas decidiu que era melhor morder a língua. A situação já era enervante o suficiente sem que ele entrasse no jogo dela.
O som do motor ronco suave preencheu o ambiente enquanto ela ajustava os espelhos. “Faz tempo que eu não dirijo, mas acho que ainda me lembro de como fazer isso sem atropelar ninguém”, ela brincou, lançando um olhar rápido para Matteo. Ela colocou seus óculos escuros e acelerou para o caminho que o celular mandava, o vento bateu contra seus cabelos à medida que ela acelerava pela estrada. Dava para ver que os olhos dela brilharam com a liberdade que ela sempre irradiava quando estava ao volante, com um sorriso cantarolando uma música que tocava no rádio enquanto acelerava pelas curvas da estrada vazia deixava ainda mais claro o desprezo pelas regras de trânsito. Se sentia como Alice Cullen a caminho de Volterra!
Ao estacionar o carro, Matteo achou que suas pernas não iriam aguentar seu peso. Por Deus, ele iria ter que voltar de ônibus ou sugerir ele mesmo dirigir. Helena deveria estar tentando matá-lo. Não era possível que ela não soubesse a sua falta de direção. Seu estômago ainda estava embrulhado das viradas súbitas dada pela atriz nas estradas quando empurrou a porta, deixando o sino de boas vindas ecoar pelo local. O estabelecimento cheirava a poeira e sálvia. Matteo caminhou cuidadosamente entre as pilhas de objetos antigos, procurando o que haviam ido buscar até seus olhos pousarem na adega. A imagem do site não fazia jus ao objeto enferrujado e a sua intuição parecia correta ao dizer que aquele era o objeto. Havia algo de muito estranho no ar que cercava o objeto e atingia Matteo de uma forma que parecia pinicar sua pele. Ele cutucou Helena e apontou para a redoma. Esperava que ela entendesse que sendo ela a carismática, extrovertida, atriz, seu papel seria convencê-lo a entregar a adega para eles.
Não precisou de muito para Helena chegar ao comerciante, tentando parecer mais uma pessoa rica que desejava começar sua própria coleção de arte. A parte boa era que Sorrentino realmente gostava daquilo, tentando puxar assunto sobre outras peças antes de soltar “E esse punhal? Quanto quer por ele?” Helena, visivelmente animada, já tinha "adquirido" algumas peças naquela tarde, mas o simples “Esse não está à venda, senhorita” fez sua expressão mudar instantaneamente, como se um botão tivesse sido pressionado. Ela franziu a testa e, sem hesitar, perguntou novamente o preço. Afinal, ela poderia pagar, não tinha dúvidas disso. Porém, Agostino permaneceu firme, seu olhar tranquilo manteve em sua decisão: “Esse punhal só sai daqui para alguém que mereça”. Obviamente ela travou no lugar cruzando os braços sobre o peito, ofendida por aquela sentença. “E o que preciso para merecer ele? Ganhar de você em um duelo?” Por que teve que dizer aquilo? O rosto do homem se iluminou de uma forma, que o “Isso mesmo!” fez que Lena só olhasse para Matteo com uma só expressão, incredulidade. “Seu amigo poderia duelar pela senhorita se quiser.”
A ideia era absurda, mas não podia dizer não e, de certa forma, culpava Helena por aquilo. Esperava que eles pudessem pagar um valor simbólico pelo objeto e ir embora. Provavelmente não tinha valor nenhum para o homem e não iria ajudar ninguém além de um grupo exótico da pequena cidade. Mas claro que a tarefa não poderia ser tão fácil. Matteo não podia dizer que tinha experiência com adagas, mas quão diferente poderia ser de defesa pessoal? Ele pegou um punhal depositado por Agostino no balcão e o encarou a lâmina. “Vamos ver do que você é feito, rapaz” o senhor disse, acenando com a cabeça para eles seguirem para o fundo da loja.
Saíram por uma porta aos fundos para uma ruela vazia. Agostino tomou uma posição a alguns passos de distância de Matteo, deixando-o confuso sobre o que deveria fazer. “Vamos, rapaz, eu não tenho o dia todo.” Matteo fez a única coisa que fazia sentido e tomou a posição oposta ao homem. Antes que pudesse se preparar, o mais velho começou a avançar em sua direção, brandindo o punhal como se fosse uma espada longa, fazendo Matteo tropeçar alguns passos para trás. ‘Que porra é essa?’ Era tudo que passava pela sua cabeça, enquanto se afastava para trás, com passos hesitantes, empurrando a mão do homem pelo lado oposto a lâmina quando achava alguma abertura. Havia descoberto rapidamente que não era bom em lutas de lâminas. Talvez um soco ou outro, numa briga de rua, mas o que quer que fosse aquilo não era para ele. Ainda tentava se desviar, quando sentiu o punhal rasgar a sua camiseta, perfurando também a sua pele no bíceps e o sangue quente deslizando pelo algodão. A ferida ardia levemente e havia desconcertado-o suficientemente para que ele caísse para trás e o homem colocasse o punhal debaixo do seu queixo.
Estava arrependido de toda aquela situação. Matteo estava se questionando se havia enlouquecido ao ter aceitado aquela tarefa quando um grito agudo perfurou os seus tímpanos. Uma jovem estava na porta dos fundos e parecia hiperventilar, os olhos fixos em Helena. Matteo teve vontade de grunhir, tudo que menos precisavam agora era de uma fã louca, mas a jovem começou a chamar o pai e, para sua surpresa, Agostino havia respondido.
O desespero de Helena por aquela luta não foi apagado pela presença da garota, tanto que antes mesmo de se dirigir à fã, ela correu imediatamente para acudir Matteo. “Você o feriu! Por Deus! Matteo, você está bem?” Seus dedos trêmulos pegaram a blusa rasgada dele, tentando cobrir o local da ferida, embora o corte não fosse tão profundo quanto parecia à primeira vista. O simples gesto de tentar aliviar a dor dele revelava sua angústia. “Só queríamos aquele maldito punhal!” Ela acusou com a voz cheia de um desespero fabricado, assim como os olhos marejados de lágrimas, fingindo perfeitamente que seu coração apertava pela visão do homem ferido .
A garota que acabara de chegar entrou em pânico ao ver sua atriz favorita tão abalada, sua expressão de choque se transformando rapidamente em indignação. Ela olhou para o pai, furiosa, e avançou com passos rápidos, começando a discutir com o homem. “Dá logo essa velharia pra ela, pai! Por tudo que é sagrado!” Ela implorou, quase gritando, antes de se virar para o casal e pedir desculpas pelo que o velho havia causado. Agostino, no entanto, se manteve firme. Tentou explicar, com calma, que aquela peça era muito mais valiosa do que poderia imaginar, mas a raiva tomou conta dos olhos da jovem, que não parecia disposta a ouvir explicações. “Ela é Helena Sorrentino, pai!” A garota quase rugiu, os olhos brilhando de fúria. “Se você não vender essa adaga maldita pra ela, eu juro que nunca mais falo contigo!” A pressão na voz da jovem, misturada com o desespero de Helena, parecia colocar o comerciante em um impasse — um que ele claramente não queria enfrentar.
Ele inventou um preço simbólico, mas consideravelmente alto, o que fez a filha protestar imediatamente. “Pai, abaixa isso! Ela é Helena Sorrentino!” Ela exclamou novamente, e rapidamente ajustou o valor, decidida a garantir que sua estrela de cinema favorita saísse de lá com o punhal que tanto desejava. Sem hesitar, Helena pagou a quantia exigida, pegando o punhal com rapidez, como se temesse que o comerciante mudasse de ideia. Com um suspiro de alívio, ela limpou as lágrimas dos olhos e, em um gesto de gratidão, ofereceu uma foto à jovem, que aceitou sem pensar duas vezes, os olhos brilhando com a empolgação de ter feito algo importante.
Não demorou para que as duas saíssem daquele lugar caótico, tendo a discussão que ocorria dentro da loja sendo apagadas pelo barulho da cidade. Já na rua, Helena olhou para Matteo, que ainda estava visivelmente machucado. “Precisamos ir ao hospital. Você precisa tomar uma vacina e cuidar disso direito”, disse ela, a voz firme, mas cheia de preocupação. Ela sabia que o ferimento dele não era tão grave, mas a apreensão não a deixava relaxar.
( @khdpontos, @sorrentinosmuse )
Ele estava estranhamente presente no evento. Fiera dei Sensi. Era um evento estranho, um que normalmente não veria ele tão participativo. Talvez ele fosse convencido por Olivia a fazer uma aparição, em circunstâncias diferentes, mas desde seu encontro com o espelho, os rituais... Matteo não sabia mais no que acreditar. E acabava voltando ali, como se a casa de Rose pudesse lhe dar alguma resposta. Uma voz prática, curta, quase pragmática demais soou do seu lado. Quase uma ordem disfarçada de convite. Teria balbucidado se tivesse a capacidade de falar qualquer coisa.
Não podia deixar de notar como ela havia ficado mais bonita. Mesmo na adolescência, Aslihan já atraia olhares — ao menos o seu olhar. Era um garoto magrelo e estranho com a única garota que era legal com ele, obviamente ele não era exatamente imune. E ela era bonita. Nada daquilo exatamente ajudava nas sessãos de estudo que tinha com ela. Os cabelos escuros estavam repuxados para trás num familiar rabo de cavalo, e ele se lembrava de como ela também puxava os cabelos para fora do rosto enquanto estava pensando. Quando era adolescente, ele era bem familiar com o perfil da mulher, espiando entre um exercício ou outro que não conseguia entender. Agora, não fazia questão de esconder que estava olhando diretamente para ela, afinal ela estava falando com ele, apesar de que ela parecia preferir fazer qualquer coisa do que estar ao seu lado.
"Mmm," murmurou, com confusão quando sua fala retornou, antes de responder, "claro." Apesar da distância entre eles, tanto física, quanto emocional, existia uma familiaridade estranhamente reconfortante que Matteo não queria abrir mão. Não era exatamente como se soubesse o motivo deles terem se afastado. Ele tentou se manter amigável, apesar que Matteo e amicabilidade não eram exatamente sinônimos, mas sem esforço suficiente de ambas as partes, acabaram caindo no esquecimento. Não havia sentimento ruim da sua parte. Era apenas como se tivessem descobrido o quão diferente eles eram. Aslihan era muito boa para ele. Ele constantemente se sentia um completo desajustado ao redor dela. Era como se ela refletisse todas as coisas em que ele falhava miseravelmente. Ao mesmo tempo, ela não o fazia se sentir mal consigo mesmo. Não, Matteo fazia tudo aquilo dentro da sua própria mente, enquanto Asli não era nada além de agradável. Isso era, ao menos no passado. Ali, naquele momento, Aslihan não demonstrava nada além de imparcialidade, apesar que ele sentia como se tivesse voltado aos quatorze anos — estúpido demais para produzir qualquer pensamento coerente junto dela.
Andaram em silêncio para a frente da fila. Observava-a pelo canto do olho, como anteriormente o fazia, sempre que achava que ela não notava. A proximidade que criaram durante os anos era... Excêntrica. Por um lado, o que os aproximou havia sido a ajuda que ela lhe dava nas matérias, como uma professora diligente, porém era muito mais atenciosa com a sua dificuldade de compreensão do que seus próprios professores. Por outro lado, Matteo podia ficar escutando-a falar por horas, sobre qualquer outro assunto, assistindo envolto desde jovem o cometa que ela era. No auge dos seus quatorze anos, entretanto, ele não tinha desenvoltura o suficiente para sequer entender a atração, ou fazer algo sobre isso e, quando eles se afastara, ele definitivamente não tinha maturidade emocional suficiente para ir atrás e entender o que aconteceu. Ele deixou-a ir, sem brigas e sem esforços. Com o passar dos anos, pensou menos e menos no que poderia ter feito errado, aceitando o acontecimento apenas como fatos da vida. Agora, anos depois, talvez ele devesse ter se arrependido, tentado entender melhor o que houve, ou simplesmente não tê-la deixado ir com facilidade. Mas não podia fazer nada sobre.
@khdpontos
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óculos kinect
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Ela lembrava. Lembrava dele pequeno, franzino, com o olhar perdido sobre o caderno de matemática e os dedos tamborilando a mesa como se pudessem evocar a resposta certa. Aslihan tinha doze anos quando começou a ajudar Matteo com os deveres — uma tarefa voluntária que aceitou mais por teimosia do que por vocação. Mas havia algo nele que a fazia permanecer: uma doçura tímida, uma necessidade de aprovação, um desejo sutil de ser visto que ecoava fundo nela. Naquela época, ele olhava para ela como se ela fosse feita de ouro e palavras sábias, como se não fosse possível errar na presença dela. Ela não sabia do crush. Matteo era muito sutil ou ela muito desatenta. Mas era um afeto silencioso, inofensivo, quase puro demais pra incomodá-la. Aos quinze, ele parou de pedir ajuda. Passou a malhar, arranjou novos amigos, descobriu uma autoconfiança que não incluía mais lições de casa nem tardes com ela. Aslihan não se surpreendeu. Só confirmou, mais uma vez, que as pessoas gostavam dela enquanto precisavam dela. Depois? Sumiam. Matteo foi só mais um. Era essa a visão que ela tinha da relação dos dois. Agora, vê-lo em Khadel, ambos adultos, ela não sabia mais se tinha alguma mágoa. Talvez fosse só... indiferença. Uma camada fria que cobria um incômodo antigo e que ela preferia não cutucar.
Aslihan tinha ido à Fiera dei Sensi no impulso de fazer algo novo. Nos últimos tempos, vinha tentando sair do próprio casulo, mas optando por continuar sozinha. Caminhava entre as instalações tecnológicas, as salas que misturavam aromas e sons, os sorrisos dos casais, a animação dos jovens que aproveitavam o momento para flertar, as crianças que se divertiam com as novidades, e tudo parecia mais colorido — menos para ela. E foi aí que viu a sala do Óculos Kinect. Uma das experiências mais faladas do evento. Uma imersão sensorial, uma viagem completa. Ela não resistiria. Mas a fila... estava impossível. E claro, como tudo em Khadel agora, os reencarnados tinham prioridade quando estavam em duplas. O incentivo ao amor pairava sobre a cidade como uma névoa adocicada, sufocante, mas que poderia ser muito útil agora. Ela olhou em volta. Procurou um rosto conhecido entre os nove. Qualquer um. Mas só viu ele. Matteo. "Não", pensou, cruzando os braços. "Qualquer um, menos ele." Virou o rosto, seguiu andando devagar, tentando encontrar outro par. Ninguém. Ninguém ali que pudesse ajudá-la a furar a fila e garantir a experiência. A irritação queimou devagar dentro dela. Até que respirou fundo.
Ela podia simplesmente pedir. Ser direta. Objetiva. Não ia morrer por isso. Além do mais, se eles fossem almas gêmeas? Não que ela estivesse disposta, mas parecia uma boa desculpa para se aproximar. Só estou fazendo isso por conta da maldição. Caminhou até ele, passos firmes, olhar decidido, ainda que por dentro cada parte de si gritasse que era uma péssima ideia. Parou ao lado dele, braços cruzados, e falou com a voz mais prática que conseguiu reunir: — A fila do Óculos Kinect tá enorme. Reencarnados têm prioridade quando estamos em pares. Você vem comigo? — Nenhum "oi", nenhum rodeio, nenhum sorriso. Só um convite seco, direto e impessoal. A forma mais segura que encontrou de se proteger da lembrança de um menino que, um dia, a olhava como se ela fosse feita de luz. Ela não era. Nunca foi. E não estava ali pra reviver ilusões. Estava ali pra ver baleias flutuando, sentir o vento no rosto numa montanha-russa digital, fugir de zumbis ou dançar num show que nunca viu. E, se pra isso precisasse dele, que fosse.
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Matteo decidiu ficar calado com o murmúrio. Parecia que nada que falava ou fazia em relação à Helena dava certo. Ele estava sempre errado de alguma forma — porque ele não dava abertura, ou não fez o comentário correto, ou olhou de forma enviesada. A luz filtrada pelas ervas penduradas parecia brincar com os contornos do rosto dela — e ele odiava que tivesse reparado nisso. “Se ela jogar água em mim, eu juro que levanto e vou embora. Espiritualidade tem limite.” Tentou manter o tom leve, mas o incômodo era difícil de disfarçar. Sentia a camisa colando nas costas por causa da umidade, e não era só suor físico. Era o peso do espelho, da imagem que o perseguia mesmo ali, mesmo com tudo coberto, borrado, envolto em incenso. Virou o rosto só o suficiente pra encará-la quando ela falou sobre escolher. “Se desse pra escolher isso, eu encomendava três litros,” murmurou, ultimamente ele precisava bastante disso. “Mas acho que coragem é o mais próximo,” fez uma pausa, “coragem é bom. Clareza também. Mas se tiver um item extra chamado ‘me deixar em paz’, eu levo esse.” Tentou brincar, mas a voz saiu mais baixa. Um fio de verdade passando ali. Ele cruzou os braços, desviando os olhos outra vez, como se pudesse se proteger só com isso. “Vamos escolher logo antes que ela volte com um galho de arruda.”
Aquela velha louca parecia que tinha enchido a cara de café, nunca em toda vida Helena tinha visto a mulher ser tão rápida quanto no momento que ela lhe escolheu junto com Matteo para aquela maluquice. Obviamente ela não iria ficar contra a curandeira, mas não deixou de arquear uma sobrancelha ao ouvir o comentário de Matteo, um sorrisinho enviesado se formando nos lábios enquanto o cheiro de lavanda e hortelã começava a envolver o ambiente "Nossa, que incentivo, hein?" murmurou baixinho de volta. " Aguentar um pouco? Matteo, amor, essa é a parte fácil. Da corda para ela para ver se não começa a jogar água em você pra te dar "clareza espiritual"… aí sim você vai ver o que é sofrimento." tentou brincar, mas a senhora pareceu ouvir. A parte boa é que ela só ignorou. O calor do ambiente, a umidade dos sprays de ervas e a iluminação suave provocavam nela uma sensação de estar dentro de um sonho que beirava o desconfortável. Ela deu uma olhada rápida para Matteo enquanto a curandeira começava a entoar as primeiras palavras da bênção, falando de equilíbrio, de reencontros espirituais, de almas que cruzam caminhos por um propósito. "A gente vai escolher o quê?" sussurrou, um pouco mais séria agora, virando-se na direção dele. "Não sei você, mas eu tô bem inclinada a escolher coragem. Ou talvez clareza. Ou sei lá... será que dá pra pedir uma mistura que inclua "parar de surtar"?"
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Ele deu uma risada sem graça com a pequena impressão dela e um haltere. Pasqualina na academia havia sido provavelmente só uma miragem que um dia ele havia visto. Ele prometeu ajudá-la, mas ela nunca aparecia — sempre muito ocupada com o grupo das jasmines, margaridas, ou sabe-se o quê? Eles eram tão diferentes. "Scarlet?" Ele repetiu, com o levantar de sobrancelha, e observando o corpo dela se fechar ao falar da outra. Matteo não era do tipo que gostava de se meter no assunto dos outros, mas o jeito que Lina agia ao nome da outra lhe parecia... estranho. Normalmente, Scarlett não era uma pessoa muito... agradável, mas o que ele via não era desprezo. Era um certo tipo de agitação diferente. "Parece ter sido agradável, Lina. Bem, a gente certamente vai se ver por ai."
ENCERRADO ( @khdpontos )
Movimentou a cabeça no mesmo ritmo em que as palavras saíam dos lábios de Matteo, os olhos levemente arregalados devido ao teor da frase, mas logo a expressão se desmanchou nos lábios curvados, segurando uma risada. Achou engraçado a forma como ele tinha escolhido uma palavra não ofensiva, somente por ser ela a sua interlocutora, talvez imaginasse que Lina se dissolveria em um monte de açúcar ao escutar um palavrão. "Acho que no hospital você teria ainda mais tempo livre, não? Ia ficar completamente sem treinar e tudo..." Ao mencionar o treino, simulou um movimento de musculação, como se flexionasse um halter.
"Um duelo? Com facas? Meu Deus..." Ficou imaginando a cena em sua mente e ficou alguns segundos em silêncio, a cabeça levemente inclinada enquanto imaginava Matteo duelando como um espadachim. "Fico feliz que não tenha sido nada grave e, ah, eu fui com...com a Scarlet." A mudança de expressão foi evidente, ao mencionar a ruiva as sobrancelhas se curvaram e os braços se cruzaram. "Nós tivemos que tomar um chá e jantar com a senhora Castellani, ela tinha o pingente da Julieta e...Bom, foi bem agradável conhecer a senhorinha, ela não nos chamou para um duelo nem nada disso." Apesar das palavras doces, sua expressão era contraditória, ficava séria e defensiva toda vez que recordava do beijo que trocara com a menina malvada de Khadel.
"Não," reiterou novamente, com pressa. Parecia uma péssima ideia para ele ter que explicar como ele ganhou aquele ferimento. O seu orgulho também estava um pouco ferido, pelo corte feito por um cara muito mais velho e menor, mas ele não sabia nem por onde começar a explicar o porque ele havia topado aquela ideia maluca quando foi proposta. Qualquer pessoa que olhasse o punhal podia ver que ele não valia muito. Não entendia nem ao menos o apego do homem aquele objeto. Tudo que Matteo podia sentir era uma energia estranha quando segurava o punhal. Matteo não podia estar com menos fome depois de todos os acontecidos. Haviam conseguido a adega, mas aquela história estava mais insana que necessário. Como alguém podia acreditar que eles precisavam arriscar suas vidas por uma maldição? Coisas como aquela não existiam. Mais ele não havia sido exatamente muito amigável com Helena (não que ele fosse com qualquer pessoa), e ela parecia dar o seu máximo para isso. Ele podia ser ao menos um pouco menos inflexível. "Pode ser," ele disse, forçando um sorriso com os lábios pressionados uns aos outros. "Eu posso dirigir agora," Matteo sugeriu, rezando silenciosamente para que Helena estivesse cansada ou abalada demais e concordasse com ele.
STARTER TO @thematteobianchi APÓS CONSEGUIR A ADAGA DE ROMENA
Todos aquela confusão com o velho maluco do antiquário tinha deixado Helena uma pinha de nervos, ainda estava sem acreditar que ele tinha realmente desejado lutar com um jovem o dobro do tamanho dele , pior, tinha o ferido! "Tem certeza que não quer ir no hospital?" perguntou novamente. Tinham passado na farmácia e comprado o que precisavam e feito o curativo, porém a preocupação da mulher era genuína. Sabendo que não tinha muito o que pudesse fazer a mulher soltou um suspiro pesado olhando em volta "Pelo menos vamos comer alguma coisa? Não sei você, mas to sem comer desde o café da manhã... O que? Achava que ia ser rapidinho com a Zafira"
igreja de khadel com @eusouscarlet
Matteo não ia há igreja todos os domingos, apenas em algums. Por insistência de sua mãe, aquele era um deles. Depois da festa das máscaras, talvez ele precisasse pedir perdão pelos seus pecados. Matteo nunca foi altamente religioso. Também nunca havia visto nada de errado em homens ficando com homens. Porém, nunca havia sido o caso com ele. E, como se a sua situação não pudesse piorar, um dos homens que ele havia beijado era a pior pessoa do mundo. Foi uma grande surpresa que Matteo havia sentado o sermão inteiro e não havia sido enviado direto para o inferno. Se não por ter ficado com homens, pelas mentiras envolvidas naquela situação. No fim do sermão, um rosto familiar surpreendente entrou em seu campo de visão, e pedindo licença para sua mãe, ele foi até a ruiva. "Pensei que você derretia entrando na igreja," disse, apesar da falta de intimidade entre eles. Depois de dois rituais e uma maldita maldição que os entrelaçava, talvez ele acreditasse que pudessem ser um pouco informais.
antes do evento﹔pós group chat
jardins da rose com @neslihvns
No fundo, Matteo sabia que era maluquice. Era difícil de acreditar em coisas como maldição, ou almas gêmeas, ou como aquela história se entrelaçava com eles de qualquer forma. E, dentre eles, claro que Neslihan seria a mais cética. Ela sempre foi muito lógica e tinha a mania irritante de estar sempre certa (normalmente estava), e ele duvidava que ela acreditaria em algo maior que ela em qualquer momento. Porém, o que ele não imaginava era ela utilizando dos mesmos argumentos que todo mundo jogava na cara dele — não ela. Ele não era a pessoa mais esperta do mundo, mas sabia muito bem quando zombavam dele. Era isso o que mais o incomodava. O fato dela ter jogado na conversa, tão casualmente, em frente a todo mundo.
Ele havia ido para um dos muitos lugares na cidade em homenagem à Rose. Ironicamente, era um lugar que ele ia muito com Neslihan quando mais jovens, e agora apesar do sentimento conflitante em relação à antiga amiga, ele ainda gostava de ir la para espairecer. Achou que estava sozinho no lugar, mas um farfalhar das folhas indicava que alguém estava saindo ou chegando (ou talvez se escondendo como ele adoraria fazer).
O fato de que havia aceitado um encontro deveria ter sido um motivo de fofoca, mesmo que a pessoa com quem ele havia aceitado o encontro fosse Helena Sorrentino. Matteo normalmente dava motivos para as pessoas fofocarem exatamente pelo número de encontros que ele não aceitava e o fato de que apenas a estrela de cinema havia sido suficiente para fazer com que ele mudasse de ideia certamente iria aumentar o conto de que ele achava que ninguém era bom o suficiente para ele. Ninguém podia ver as engrenagens da sua cabeça trabalhando arduamente para fazer sentido de toda aquela história.
E pouco fazia sentido.
Talvez se fosse mais sociável já teria tido as respostas que gostaria e poderia sair dali vitorioso, mas, no momento, ele arranhava o tampo da mesa distraidamente com uma das unhas para manter-lhe presente no encontro enquanto evitava ir muito a fundo na sua psique. Era claro que o encontro era desconfortável para ele, sempre numa posição de defesa, mas parecia inocente suficiente pelo olhar externo. A música, as pessoas, as péssimas vozes massacrando a música escolhida no karaokê... Não havia nada naquela situação que o fizesse mais confortável e sabia que não deixava as coisas mais fáceis para Helena. Mas uma das coisas que havia aprendido era a determinação de levar as coisas até o fim. E, assim, ele veria aquele encontro com Helena até o fim, por mais desastroso que acabasse sendo. As palavras dela lhe atingiram como um caminhão, já que ele nunca havia imaginado uma vida fora de Khadel e, agora, simplesmente ele era forçado a imaginar as coisas mais frutíferas e longínquas em um curto espaço de tempo. Matteo não sabia se estava disposto a vida que Helena poderia lhe dar, assim como ela bem decididamente não estava propensa a vida que ele tinha em mente. Ele poderia ganhar muito, mas tinha que estar aberto também a abrir mão de muito.
Ele franziu as sobrancelhas com leve confusão. Matteo não precisava que ela apontasse que a fama que cada um deles possuia era diferente. Mas a fama que ele possuía não era algo que ele desejou ou buscou. Um acidente do destino. Não podia necessariamente reclamar, afinal, era responsável por ele ter uma vida financeira mais estável que sua mãe jamais teve, porém sempre revirava os olhos com a atenção que recebia. E, particularmente em Khadel, Matteo recebia bastante atenção. Ele sempre quis ser incluído, ser tratado como um deles, mas mesmo com tudo que havia feito para se encaixar, não poderia se sentir mais deslocado. Tentou desviar do assunto inicial ─ gostava de música, definitivamente não iria cantar ─ e aproveitou o toque sutil dela para entrar no assunto que eles realmente deviam dar atenção. Tudo poderia mudar dependendo do que ela acreditasse. Se Helena realmente acreditasse na maldição, ela estava buscando encontros românticos e ele seria uma péssima escolha, ainda mais no Loft. Deveria ter chamado o Christoper! "Então você acredita que existe uma maldição?" Matteo levantou uma sobrancelha com a pergunta. Ainda estava descrente em relação ao status da maldição, mas estava definitivamente curioso com os acontecimentos recentes, e era aonda mais buscava respostas dos supostos encarnados.
As musicas de fundo e a movimentação das pessoas no local eram uma distração bem vinda para os mil pensamentos que passavam na cabeça de Helena. Já tinha falado com seus fãs e, com o pedido para que pudessem deixá-la aproveitar a noite como eles, ninguém realmente parecia notar o quão estranho era a relação do casal. A risada, porém, saiu dos lábios da negra que negou com a cabeça rapidamente para aquela pergunta "Eu posso estar gostando dessa calma, mas certeza que eu surto se ficar mais do que algumas semanas nesse lugar." respondeu leve encostando o corpo na cadeira brincando com o canudo da bebida despretensiosamente. Sua mente vagava em alguma forma de quebrar o gelo sem ficar parecendo uma esnobe ou uma idiota. Normalmente as pessoas vinham super animadas e interessadas em conversar consigo, então o jeito mais retraído do homem a deixava desconcertada. Só que tinha se proposto fazer dar certo "Sem querer desvalorizar seu trabalho, mas essa fama de Instagram é bem diferente do que eu vivo. Isso aqui..." ela fez um sinal para o bar inteiro como se pudesse sinalizar a situação que estavam "Não aconteceria onde moro. Estar entre os civis sem uma câmera apontada para mim, sem o furor dos fãs... Ou pelo menos não sem pagar o dono do restaurante." ela deu um suspiro saudoso, mas acabou por dar uma risada discreta negando com a cabeça. Amava aquela vida. Não lhe custava atender o publico, tirar fotos, gravar textos... Na verdade ela amava como valorizavam seu trabalho, então gostava ainda mais quando os olhos voltavam para si. Ela até ia oferecer o gostinho de sua vida, talvez um story no instagram, na esperança de abrir um pouco mais aquelas barreiras, mas achou que seria pretencioso demais querer comprar alguém assim na cara dura "Gosta de musica? Digo, estamos num karaokê... Seria um belo fora se tivessem te botado aqui contra vontade. Não sei os critérios que estão usando para decidirem quais são os melhores lugares... Mas temos que convir que não tamo sabendo é de nada com esse lance da quebra da maldição..."
Matteo era, normalmente, o dobro do tamanho de uma pessoa comum. O seu corpo ocupava muito espaço e, se alguém tentasse lhe atravessar, provavelmente eles não teriam muito sucesso. Então, quando o estranho esbarrou com ele, seu corpo mal sofreu o impacto, mas ele sentiu o corpo da pessoa reverberar para trás. Estava pronto para pedir desculpas, mesmo não tendo sido sua culpa, mas ao ver quem era ficou astônito por um minuto. Nunca a via por lá e isso dizia muito porque Matteo vivia naquele lugar. Ele deu um passo para a lateral, Graziella deu um passo para a lateral. Ele deu um sorriso nervoso. "Bom dia, Graziella." Não existia muito entre eles, mas não era muito difícil para ele se sentir intimidado por Graziella, independente do seu tamanho. Não era nem mais o fato dela ter sido do mesmo grupo de pessoas que o atormentavam. Era apenas como ela se portava. E ainda mais agora com aquela história de alma gêmea. A ideia de um deles ser alma gêmea da Graziella, para ele, era intimidador. "Como foi a sua missão?" Acabou perguntando.
ONDE: CASA COMUNE
QUEM: GRAZIELLA & @thematteobianchi
Normalmente a mulher fazia seus exercícios dentro de sua própria casa e na academia exclusiva que tinha, mas naquele dia em específico havia resolvido fazer algo diferente. Já vestida para o treino, Graziella chegou ao estabelecimento com sua bolsa de academia em um dos ombros, os pés firmes em direção ao caminho que sabia que deveria ir, até mesmo passando pela recepção sem dizer nada. Ela só não esperava que alguém virasse e entrasse em seu caminho e trombar com o corpo que quase a derrubou no chão. Os olhos verdes por um segundo chegaram a se erguer na direção da pessoa com a intenção de matá-lo com o olhar, mas não precisou chegar muito longe para saber de quem se tratava e deu tempo da empresária suavizar levemente a expressão. "Desculpe, Matteo. Bom dia." Murmurou, tentando passar por ele para continuar seu caminho.
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